Um novo alguém

E por muito tempo ela dormiu! Eu fiquei aqui observando e vivendo. Amanhecia e eu seguia, caia à noite e eu voltava… e nesse baile natural, os anos se passaram, pássaros voaram, borboletas nasceram, flores murcharam…e ela acordou!

Fico agitada! Nossa, quem será esse ser que desperta? Quem será esse ser, que até hoje não sei seu nome ou será que sei? Quantas coisas tenho para perguntar, para contar. Será que ela é mais feliz hoje? Será que eu sou mais feliz hoje? Será que mudamos muito ou será que nada mudou?

A última coisa que conversamos foi sobre os medos, lembro que foi bem intenso. Hoje talvez ela não tenha mais tantos assim ou aprendeu a lidar com os que já tinha. Nossa, que euforia! Quero que ela me veja, quero olhar para ela, perceber o seu despertar manhoso, como quem não quer levantar, quer ficar mais 5 minutinhos de olhos fechados.

Ela me olha, me encara fixamente, parece confusa, parece não me reconhece, mas assim que arregala os olhos e percebe que sou eu, ela abre um sorriso tão bonito, talvez não acredite no que está vendo, o tempo passou e eu continuei ali velando seu sono, cuidando da vida mas sem deixar de observá-la.

– É você! Como me alegro por ser a primeira pessoa que vejo ao despertar. É tão rara a minha vinda para a sua realidade, sempre fico bem no interior do meu eu, do seu eu. Acho que já notou que mudei, né? Estou mais falante…rsrsrs…e menos receosa ao me aproximar de você…

– Uau! Sério mesmo que é você? Como está mudada, parece mais confiante, mais segura de si, parece que descobriu o amor! Como foram esses longos anos de profundo adormecer?

Ela se ajeita, se recompõe, desperta de fato e como quem se prepara para uma longa conversa, fecha os olhos por alguns instante, num gesto de quem busca, de forma profunda, todo o conhecimento que se deseja expor, então começa:

– Sinto que mudei mesmo, na verdade amadureci. Ainda tenho os mesmos medos, porque descobri que certos medos não perdemos nunca, pois eles fazem parte do nosso aprendizado. Viver sem medo significa não ter mais nada para aprender, não ter mais nenhum horizonte para conhecer, não ter mais o que arriscar. Os medos fazem parte da nossa caminhada e é normal senti-los. Mas cuidado! Não podemos ser reféns por achar que temos que sentir, os medos existem e devem ser ultrapassados em seu grau momentâneo, para que ele evolua junto com a alma.

Quando nos falamos da última vez, eu ainda não sabia quem eu era, parecia que tinha acabado de nascer. Nesse meu longo período de hibernação espiritual, muitas coisas foram reveladas, muitas palavras foram ditas, muitos sentimentos foram sentidos e um mundo novo se abriu diante de mim.

Fui até esse mundo que eu já fazia ideia que existia. Quis saber mais sobre ele, quais eram seus habitantes, como era sua organização, qual influência exercia em mim. Percebi em pouco tempo de chegada que, tudo que existia nele, também existia em mim. Eu sempre fiz parte dele, nunca fora imaginário, sempre foi o meu lar, onde me refugiava para sarar o carte, para sanar a dor, para receber a orientação, para ter sustentação, para me banhar de luz e de muito amor.

Existe um mundo dentro de nós, cujo guardião de sua chave fala conosco o tempo todo. Pare um momento e ouça, ele grita! Ele faz seu coração pulsar, acelerar, serenar. Ele faz sua alma vibrar, sua energia irradiar, seu poros captarem.

Me deixei levar por esse guardião que sempre esteve comigo e que agora, nunca mais deixarei de estar com ele. É como se eu também estivesse dormido por muito tempo lá, e ele também velou meu sono. Mas não é como você, que vela aquela que está dentro de você, ele vela aquela que pertence àquele mundo, aquela que é dona da chave que ele tem a missão de guardar e entregar sempre que ela regressar.

Não sei dar nome a esse mundo, pode ser o mundo dos sonhos, o mundo da imaginação, o mundo dos sentimentos ou até mesmo o mundo espiritual. Acredito que o nome é a última coisa que queremos saber quando se está nele, pois o turbilhão de coisas que vão acontecendo são bem mais relevantes, querer captar cada sentimento, gravar cada mensagem, assimilar cada lição. E como é bom estar lá, tudo parece fazer sentido, tudo ganha uma compreensão fora do comum, diria que é transcendente, não consigo encontrar palavras para descrever.

O que posso te falar é que, uma vez lá, nunca mais se retorna ao que era. Sua visão ganha uma clareza, percebe-se que se esteve o tempo todo cega, não adormecida, cega mesmo. Pois eu estava lúcida quando via fragmentos desse mundo em meus sonhos, mas a cegueira espiritual, me deixava em volta à uma camada densa de nevoa, então você abre a porta e o sol limpa tudo, e como é bom!

Acho que hoje quem vai ficar em silêncio será você, né? …rsrsrs… Retorno de um logo sono e nem deixo você falar sobre você… é que foi tão bom estar lá que logo você vai sentir tudo isso, aliás, acho que já está sentindo, não é? Vejo em seus olhos o brilho que ganhou com o meu retorno, e como você sente tudo o que sinto, já deve saber do que eu estou falando, não é?

– Sim! E nossa, como é bom!….

Ártemis 

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